sábado, 24 de agosto de 2013

Pedido




foto by Thais Feminella



Eu sou distraída. Assim, nas vezes que eu lembro de usar óculos um pouco menos, mas nos dias em que não tive nem tempo de cozinhar e saio do último atendimento direto para o restaurante da esquina, eu sou distraída. Muito.

Então num dia desses entrei lá, fui direto para o buffet, com a  cabeça fervilhando ainda de trabalho, pensando em coincidências, do que eu ando sentindo ultimamente, do que é fantasia e o que pode ser realidade, e do que, se for realidade, eu posso fazer a respeito. Entrei, me servi, sentei na mesa do canto e comecei a comer sem notar nada ao meu redor...

Mas mesmo na minha abstração, algo me chamou... Algo do mundo real começou a me puxar. E quando prestei atenção e procurei ao redor o que era, me deparei com um par de olhos pretos, magnéticos, que me olhavam fixamente, sem nenhum pudor. O dono dos olhos tinha parado com a colher a meio caminho da boca, que continuava aberta, e nem piscava. Devia ter uns 4 ou 5 anos...
Os pais estavam com mais uns três adultos na mesa, e conversavam distraidamente em volta de algumas cervejas, então ninguém prestava muita atenção nele...
Bom, depois que a gente é mãe, começa (se ainda não gostava antes) a gostar de crianças, e aprende a interagir um pouco com o mundo deles. Então sorri, torcendo para não haver nenhum pedaço de alface ou brócolis no dente que quebrasse o encanto, acenei de leve, e fiz sinal pra ele continuar comendo. Ele não me obedeceu... Colocou a colher no prato e continuou a me encarar. Eu me distrai novamente entre pensamentos e comida, mas a cada espiada que eu dava para a mesa ao lado, os olhos estavam lá, às vezes acompanhado de um sorriso solto, às vezes só me olhando atentamente.

Quando terminei, o pessoal da mesa dele ainda conversava e ria, entretidos ... Então me levantei, dei um tchauzinho para o menino e fui pagar minha comanda. De repente senti alguém abraçando minhas pernas... era ele... Que me solta:

-Quando eu crescer, casa comigo?

Olha, vou dizer que fiquei tentada a responder que sim, afinal pureza é uma coisa que a gente não encontra em qualquer esquina... Mas fui salva de fazer uma promessa sem esperança de ser cumprida pela mãe envergonhada que puxou o menino, me pedindo desculpas...

Mas afinal, desculpas por que?

...Fui embora trabalhar um pouco mais, torcendo pro garoto ao crescer não perder todo aquela soltura linda... com um pouco mais de sorriso no rosto e muita gratidão pelos meninos encantadores da vida....





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